Aqui os repórteres deixam bem claro porque não agarraram a ‘materialização’ quando tiveram chance. Muito agradeço a Vital Cruvinel pela disponibilização da reportagem.
A REPORTAGEM QUE NÃO FOI ESCRITA
Mário de Moraes
MINHA EXPERIÊNCIA EM UBERABA (III)
CONTINUEMOS no item a,
derrubando a primeira das acusações que me foram feitas. Voltemos ao
fato de eu ter ou não ter medo da “Irmã Josefa”. Deixando de lado a
modéstia, devo relembrar ao infeliz “colega” que o meu passado
jornalístico, por si só, bastaria para botar abaixo a sua afirmativa.
Fui o primeiro e, creio, único repórter brasileiro a visitar a
linha-de-frente na Guerra de Angola; testemunhei revoluções na
Argentina; reportei o assassinato de Trujillo, debaixo de violenta
ditadura: entrei em cidades sitiadas; desafiei a morte em diversas
ocasiões. O medo material, portanto, não poderia existir. O espiritual,
muito menos. Porque, segundo o espiritismo, só entidades de muita luz
é que podem materializar-se. A Irmã Josefa, em vida, ao que se informa,
foi uma freira de extrema bondade, que cuidava de enfermos, dedicando
toda a sua existência a fazer o bem ao próximo. Se ela, na verdade,
resolvesse materializar-se, não me faria nenhum mal. Mal estão fazendo à
sua memória aqueles que a apresentam como uma madre dissoluta, que teve
relações com um padre, destas nascendo-lhe uma filha, a médium Otília. A
história — para explicar a semelhança entre “mãe” e “filha” que poderia
aparecer nas fotos — me foi contada, na presença de diversas
testemunhas, pelo Dr. Sebastião de Melo. Que disse tê-la confirmado,
numa visita feita ao túmulo da Irmã Josefa, num cemitério de freiras.
Esta era a única que, por não ser virgem, não tinha “Maria” na lápide.
Pura tolice! As freiras estrangeiras não têm Maria no nome. E a Irmã
Josefa era italiana. Se verdadeira a história do Dr. Sebastião, a madre
não seria bastante pura para materializar-se. Perguntaram os tais da TV:
— “Se eles sabiam que a Irmã Josefa era falsa, por que não a
agarraram?” Isto pede uma longa explicação: 1.°) ficara resolvido que só
na segunda experiência tomaríamos drásticas medidas. E isto
prometêramos ao nosso colega José Franco, convidado para assistir à
sessão, e que nos levara como testemunha. Se nós ficássemos convencidos
da fraude, no dia seguinte agarraríamos a “materialização”; 2.°)
controlados como estávamos em nossas cadeiras, tendo sempre dois deles —
um de cala lado — “sentindo” os nossos movimentos (e isso explicarei
mais adiante), só quando estivéssemos sendo fotografados ao lado da
entidade é que teríamos oportunidade de segurá-la. Se, no cumprimento
que eu lhe desse (ela não consentiu), a “Irmã Josefa” não conseguisse
“desmaterializar” a sua mão, seria hora, também, de agarrá-la, pois
estaria comprovada a fraude, não havendo necessidade de uma segunda
exibição; 3.°) mesmo que eu abraçasse a “Irmã Josefa” ou o “Dr. Alberto
Veloso” (outra entidade “materializada”) não provaria nem veria nada. A sala continuaria às escuras
e trancada. O “flash”, em poder do nosso colega José Nicolau, estava
sendo controlado pelo “fotógrafo-oficial” do grupo. O interruptor da
pequena luz vermelha ficava, todo tempo em que eram batidas as fotos,
nas mãos do Dr. Waldo. A “Irmã”, naturalmente, daria um grito. Com o
pretexto de que eu poderia “matar” a médium, vários deles me arrancariam
de cima dela, levando-me, sei lá como, de volta ao meu lugar. E Otília
teria tempo suficiente para se recompor, voltando à cadeira onde
estivera “manietada”. Se eu rasgasse as vestes da “Irmã”, a médium,
novamente de roupa preta, as esconderia no seu “lugar-costumeiro”. Mesmo
. que eu conseguisse guardar algum pedaço, diriam mais tarde que era
mentira: teria apanhado o tecido em outra parte; 3.°) o próprio produtor
do programa de TV, meu bom amigo Carlos Pallut, a uma pergunta de um
dos tais sujeitinhos, disse que “repórter não sofre coação”. Isso é bom
de dizer num estúdio de televisão, cercado de amigos por todos os lados.
Mas vá a Uberaba, Pallut, entre naquela sala de breu completamente
fechada, onde existem mais de 20 espectadores que você está conhecendo
na ocasião, tendo apenas a proteção de quatro colegas, e tente agarrar a
“Irmã”. Depois me conte o que houve. É lógico que não vou pensar que
todos os vinte fazem parte da quadrilha de fraudado-res. A grande
maioria acreditava no fenômeno, sendo, por isso, mais perigosa. Um
fanático pode ser responsável por atos da mais extrema violência. Na
Guerra de Angola vi negros entrarem acampamento adentro, aos gritos,
levando na mão apenas uma catana. Os feiticeiros haviam garantido que
eles, se morressem, voltariam a viver no Dia da Vitória. Por isso não
temiam as metralhadoras dos portugueses.
De gente fanática eu quero distância. Continuarei.
Aos espíritas realmente puros, uma advertência: a fraude de Uberaba só serve para desmoralizar e desprestigiar o espiritismo.
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